A mulher de sorte do UX Writing brasileiro

UX Mania
6 min readApr 8, 2023

8 de abril. V-e-r-o-n-i-c-a. 8 letras.

Verônica Motti, UX Writer / Content Designer no PicPay, nossa entrevistada do mês de abril, é uma mulher de sorte. ”Nasci no dia 08/08, meu nome tem 8 letras e a maioria dos meus documentos começam com o número 8”, detalha. “Pode ser apenas uma coincidência, mas na Ásia as pessoas dizem que isso significa boa sorte”, completa a leonina

Por falar em Ásia, Motti é “viajada” e já passou uma temporada na Tailândia e em Cingapura. “Acredito muito no modelo de anywhere office, onde o trabalho se adapta ao seu estilo de vida e não o contrário”, diz.

Voltando ao tema sorte, Vero também viveu na Irlanda, terra do Leprechaun, um tipo de duende da sorte, símbolo do país. Além da Irlanda, em seus tempos de nômade digital, entre 2017 e 2019, ela passou por Portugal.

Na conversa, falamos sobre a diferença entre teoria e prática no nosso campo, migração, estratégia, o “mito” da senioridade e muito mais!

Você trabalhou como copywriter por muito tempo, criando textos para blogs e redes sociais. Como foi sua virada de chave para UX Writing?

O caminho para o UX Writing foi meio que natural pra mim. Na minha experiência de quase 10 anos, tive contato com praticamente todos os formatos e áreas de conteúdo em de times de Marketing e agências de Publicidade.

Por ter trabalhado por tanto tempo nessas áreas, eu queria tentar algo novo dentro do trabalho com as palavras e, curiosa que sou, comecei a fuçar o LinkedIn e via gente falando sobre UX Writing. Fui pesquisar, li muitos artigos, mandei mensagens para outras pessoas, pedindo conselhos e tirando dúvidas.

Na época, meu companheiro que é web/UX/UI designer, me deu aquela incentivada pra ir pra área de UX. Tudo isso me mostrou que haviam boas possibilidades ali.

Eu acabei “trombando” o seu texto na internet e achei interessante um trecho que você diz: “nem tudo o que se aprende na teoria é exatamente o que se vê na prática”. Qual a principal diferença do que a gente aprende em cursos, artigos e livros e o que a gente aprende no dia a dia de trabalho?

Quando a gente decide que quer migrar de área, começa a absorver a teoria. Lê artigos, livros, assiste palestras, faz cursos. Tudo isso ajuda e muito. Porém…

A teoria é apenas uma parte e é na prática que surgem aqueles momentos de “cair a ficha”, porque você aprende a pensar a partir da teoria

Por exemplo, aprendemos sobre o processo de design a partir do diamante duplo. Mas, muitas vezes, na empresa que você for trabalhar o processo não será linear. Então, na prática, você usa isso como base, porque nem sempre será possível seguir tudo à risca.

Não é sair escrevendo e só focando no texto, é pensar, entender e definir problemas, regras de negócios e necessidade do usuário pensando em UX Writing. Desafios surgem, contextos mudam, estruturas e processos variam dependendo do lugar.

E dependendo do contexto de onde você vai trabalhar, as coisas podem ficar mais complexas, aí o tempo de aprendizado é outro.

Foto de um duende com um cachimbo
O “duende sortudo” Leprechaun — imagem: ancient origins

Agora é a hora de desmistificar os níveis de senioridade! Você tem muitos anos de carreira e abraçou uma oportunidade como UX Writer Júnior no PicPay. Fala pra galera o que é ser júnior e se esse “título” dialoga ou não com o que você faz de fato.

Tá aí um assunto que tenho discutido com algumas pessoas e visto bastante em posts no LinkedIn. Não há problema nenhum em ser Júnior. Todo mundo já foi, é ou será júnior em alguma área. Eu, por exemplo, sou Júnior em alguns pontos, em outros posso ser Plena e em alguns poucos posso ser até Sênior.

Acho um pouco complicado porque não é 8 ou 80 quando falamos de pessoas, sabe? Mas entendo que para o mercado acaba sendo assim por questões de contratação e experiência no geral.

Hoje levo o título de Júnior porque quando entrei no PicPay, não sabia de algumas coisas com a clareza que sei hoje, atuando no meu contexto. Então, isso varia de empresa para empresa.

A minha dica é: saiba a sua régua além de saber a régua da empresa

A gente tem essa impaciência de crescer por conta do mercado. Abrace esse estado de aprender, sem pressa e crie uma base sólida que será super útil pra sua carreira.

O problema real é quando o orçamento de uma vaga contempla uma pessoa com salário de Júnior, mas o contexto, o apoio e as demandas são de uma pessoa Plena. Eu vejo isso acontecer com bastante frequência, infelizmente.

A conta não fecha: não se contrata uma pessoa Júnior esperando comportamento e resultados de uma pessoa Plena.

Prefiro ser uma Júnior-Plena do que uma Plena-Júnior. Tem gente por aí com títulos mais altos e pouca experiência e nem síndrome de impostor tem (risos).

A gente fala muito da importância da estratégia de conteúdo. Para você, o que isso significa? E qual a diferença para uma visão de conteúdo no nível tático?

Estratégia significa trabalhar com objetivos claros a partir de problemas bem definidos. Significa ter um norte, buscar resultado e impacto dentro de onde você está.

O trabalho de UX Writing se mede, sim. É por isso que é um trabalho estratégico. É o famoso “não é só um textinho”

Já imaginou usar um produto que não cuida da orientação, consistência, contexto e tom de voz dos textos?

Quando a gente entende quais métricas se relacionam ao nosso trabalho, fica mais claro porque estamos trabalhando e o impacto disso no negócio.

Pra mim, um conteúdo mais tático é como o conteúdo será escrito. Escrever, de fato, pode ser algo mais tático. Mas antes de escrever, é preciso se basear em pesquisa e usabilidade, o que significa se basear em dados do usuário, e juntar o trabalho de writing ao trabalho de UX Researchers e Product Designers; isso tudo é estratégia.

Peças de xadrez
A importância da estratégia — Imagem: fabrikasimf / Freepik

Nós que trabalhamos com UX Writing precisamos sempre estar “evangelizando” outras áreas como os mantras: “não é só um textinho” e “sim, somos designers”. Como foi pra você desapegar um pouco da escrita e trabalhar mais com as duas letrinhas que vem antes de writing?

Lembro de um conselho que recebi: antes de trabalhar com texto, você vai trabalhar com experiência do usuário (UX). E trabalhar com isso significa ser uma pessoa que resolve problemas.

É um processo de entrar na mentalidade de designer. UX Writers são designers, não são redatores, como ainda muitas pessoas pensam.

Acho que a ficha cai mesmo quando você se vê como designer: antes de escrever, eu penso, pesquiso, volto atrás, converso com outras pessoas, valido, meço… São diversas etapas.

Não vejo UX Writing como desapegar da escrita, necessariamente. É mais um desapego pra mim, de como eu acho que o texto deve ser. Hoje, sigo apegada sobre como o texto deve ser para o usuário. E isso muda tudo.

A gente está num momento muito doido, mercado instável, Inteligência artificial, etc. O que você falaria para quem está começando agora em UX Writing?

É muito doido mesmo. Eu jamais imaginaria que poderíamos chegar a esse ponto (ou imaginaria)?

Antes de pensar em Writing, pense em UX: estude sobre o processo de design, estratégia de produto, estrutura de times. Lembre-se que não é só escrever. É entender onde você se encaixa na estratégia de produto e no processo de design.

Faça mentorias, mande mensagens para pessoas que você admira no LinkedIn, faça muitas perguntas. Escreva seus objetivos e aplique para vagas mesmo na dúvida de se você preenche todos os requisitos (a maioria das pessoas não preenche e tá tudo bem). Entenda quais são suas referências.

Leia sobre usabilidade, arquitetura da informação, heurísticas, experiência de interfaces, modelos mentais de usabilidade e como uma equipe de design trabalha dentro das metodologias ágeis

E se dê o tempo pra absorver tudo isso. Aos poucos, as coisas começam a fazer sentido.

Por fim, estou começando a oferecer mentorias gratuitas no ADPList pra quem está começando. É uma forma de eu retribuir toda a ajuda que eu recebi até agora.

Iae, o que achou do papo? Apesar do “click bait”, não foi apenas a “sorte” que fez a Vero chegar onde ela está. Tem muito mais! Chama ela no LinkedIn para conversar um pouco mais de Content Design.

Bom, é isso! Até a próxima camarada, vamo que vamo ✊

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Ideias, descobertas, engajamento, transição. Um blog sobre UX Writing, Design, Comunicação, Música e outros assuntos instigantes. Por Felipe Madureira.